Hoje
é pública a luta dos homossexuais contra as diversas formas de violências e
discriminações de que são vítimas. No entanto, diversos homossexuais, ainda,
são alvos desses atos que incidem negativamente sobre a sua cidadania. Embora a
luta dos homossexuais tenha galgado espaço público desde os anos de 1970 não
significou que os mesmos estivessem livres da opressão. Nos Estados Unidos, a
mídia juntamente com outras instituições, contribuiu para a associação da AIDS
à homossexualidade. Para reforçar esse discurso a medicina afirmou que os
homossexuais eram o principal grupo de risco. No entanto, após a luta dos
homossexuais esse estigma passou a ser questionado logo após a verificação dos
novos grupos de risco existentes e responsáveis pela disseminação da AIDS.
Dessa
forma, os avanços obtidos pelos homossexuais, principalmente nos países
desenvolvidos, foram fruto da luta por direitos, embora tais direitos ainda
sejam constantemente questionados pelos setores conservadores conforme
verificamos nos discursos divulgados no pleito das eleições para presidência do
Brasil em 2010. No Brasil os homossexuais ainda lutam por seus direitos e são
vulneráveis às diversas formas de violência. A aparente liberdade de expressão
sexual transmitida pelo carnaval esconde uma faceta ambígua da sociedade
brasileira.
O
carnaval é uma das expressões populares com maior destaque no Brasil, sendo o
símbolo cultural brasileiro mais divulgado no exterior. Essa festa transmite
para os turistas a visão de um país onde as relações sexuais e raciais são
democráticas. No carnaval os homens se travestem de mulheres e os homossexuais
são destaques nos desfiles carnavalescos. A imagem divulgada é a de que não
existe pecado ao sul do Equador. No entanto, este mito mascara uma realidade
violenta. No Brasil, segundo dados do Grupo Gay da Bahia pra 2002 foram
assassinados 126 homossexuais.
Mesmo
que homossexuais, travestis e transexuais sejam destaques sociais e admirados
nacionalmente tais como: Rogéria e Roberta Close, nenhuma família quer ter um
homossexual no seu seio. Qualquer comportamento que fuja ao modelo viril
dominante é fortemente tolhido. A admiração da homossexualidade se limita ao
outro, jamais a membros da própria família. A homofobia da sociedade brasileira
destoa da representação publicizada no carnaval. Por isso, é comum que
homossexuais sejam convidados cordialmente a se retirarem de ambientes públicos
quando demonstram qualquer comportamento de afeto para com seu companheiro ou
um amigo homossexual.
A
violência contra homossexuais vem sendo praticada desde o Brasil Colônia. Mesmo
hoje, após a luta das minorias sociais por direitos, nas últimas décadas do
século XX, eles continuam sendo vitimados. Os vitimizadores pertencem a
diferentes segmentos sociais. Alguns policiais se utilizam do seu poder para
prender travestis e homossexuais, com o intuito de espancá-los, ou de explorar
sua força de trabalho exigindo que façam faxina nas instalações da delegacia
como punição a sua sexualidade. Cabe destacar que as instituições estatais não
se empenham em elaborar políticas públicas que busquem asseguram e ampliar os
direitos das lesbicas, gays, travestis e transexuais – LGBT- que são vítimas de
múltiplas formas de violências pelo fato de sua sexualidade ser estigmatizada.
O
livro publicado pelo movimento Gay da Bahia em 2002 intitulado Matei Porque
Odeio Gay buscou expor aos estudiosos, militantes e a sociedade brasileira as
múltiplas formas de violência cometidas contra essas minorias. A partir do
final do ano de 1980 o índice de crimes contra lésbicas, homossexuais,
travestis e transexuais aumentou em cinquenta por cento (50%), se agravando na
década seguinte. Isto se deve a maior visibilidade do movimento homossexual,
alia-se a isso, a vinculação entre AIDS e homossexualidade.
Outra
forma de violência, praticada em grande escala, são as discriminações,
humilhações e violações dos direitos humanos que são realizadas por políticos,
pela mídia, pelo Estado, pelas Igrejas, por donos de estabelecimentos
comerciais, por sites da intenet dentre outros. Podemos resumir as múltiplas
formas de violência e violações dos direitos humanos contra lésbicas, gays,
travestis e transexuais expondo dados, coletados pelo Grupo Gay da Bahia
referentes ao ano de 2002:116 episódios de violação homofóbica, incluindo 9
casos de agressões e torturas, 8 casos de ameaças e golpes, 42 registros de
discriminação em órgãos e por autoridades governamentais e políticos, 8 de
discriminação econômica, contra a livre movimentação, privacidade e trabalho,
27 casos de discriminações religiosa, familiar escolar e cientifica, 24
difamações e discriminações na mídia, 12 insultos e casos de preconceito
anti-homossexual, 12 manifestações de lesbofobia e 20 travestifobia.
A
própria violência simbólica se inscreve na forma como autoridades e
personalidades do Brasil se expressam, demonstrando que a intolerância à
diversidade sexual e a homofobia estão longe de acabar conforme podemos
verificar nos depoimentos homofóbicos dos políticos e personalidades de nosso
país, como no exemplo a seguir: A proposta de liberar o estacionamento do
Parque do Ibirapuera para local de paquera gay é ridícula. "Se a Prefeita
Marta Suplicy quer um lugar para colocar a bicharada, que a coloque em um
zoológico!" Disse na ocasião o Deputado Estadual Daniel Martins, PPB/SP.
Essa declaração constitui uma forma de zombaria que tem por objetivo
ridicularizar o movimento gay. Tal fala é internalizada pelos homossexuais que
passam a considerar sua sexualidade ‘anormal’ impedindo que eles se
publicassem. Desta forma, brincadeiras e chacotas do cotidiano exercem uma
forma de poder que ridicularizam e imobilizam os homossexuais. Para finalizar
deixo um desafio: Como é possível falar em cidadania e democracia sexual em um
país onde 99% da população possui preconceito contra lésbicas, gays, travestis
e transexuais, conforme dados publicados pelo jornal o Globo no dia 08 de
fevereiro de 2009.
Em
se tratando dos direitos dos homossexuais, alguma mudança significativa ainda
está longe de ser alcançada pela sociedade, por conta da sua formação
homofóbica e sexista, aliada aos obstáculos enfrentados pelos poucos projetos
de lei que tramitam no Congresso Nacional. Com isso, a realização da cidadania
LGTB vai ficando, cada vez mais, distante do público homossexual, que tem de viver
sua identidade na marginalidade.
Por:
Fábio Bila (Professor de Ciência Política na Universidade Estadual de Santa
Cruz)